Leidson Ferraz
Cristiana Dias
MADLEIA + O -DOIDA CIA DO CHISTE HENRIQUE CELIBI & CARLOS BARTOLOMEU
Irmã Jovina, fiel espectadora da programação teatral do FIG 2011
Nas minhas idas ao Teatro Luiz Souto Dourado, para acompanhar a programação teatral do FIG 2011, funcionários de lá fizeram questão que eu conhecesse uma freira que vinha marcando presença em quase todas as peças do Festival. Claro que muitas religiosas frequentam teatros, mas aquela parecia ter um amor diferente pelos artistas do palco, sem preconceitos e indiferente aos roteiros que viessem à cena. Tanto que eu a encontrei na apresentação do espetáculo “Madléia + ou – Doida”, colagem teatral da Companhia do Chiste, do Recife, declaradamente já anunciada com uma discreta nudez masculina na encenação.
Mas lá estava a Irmã Jovina Souza, prestes a completar 76 anos no próximo dia 21 de julho. Baixinha, um tanto elétrica, com aquela roupa tradicional das freiras (de véu, vestido e crucifixo no pescoço), ela é simpática, mas foi logo perguntando: “Você não vai me complicar não, não é?”. Assegurei-a que a minha intenção era divulgar a sua trajetória – fiquei curioso por isso – e, o mais importante, o seu amor à arte teatral. Ao final da sessão, o nosso breve papo revelou as origens daquela mineira que, de um sítio na pequenina cidade de Dom Joaquim, foi direto para o convento aos 21 anos, mesmo sem o consentimento da mãe.
Irmã Jovina nunca fez teatro, mas demonstra uma paixão pelos profissionais do palco “que conseguem decorar tanta coisa”. Recentemente, ouviu de uma religiosa de Garanhuns: “Nunca vi freira em Festival!”. Sua resposta foi imediata: “Se tiver jeito em venho, afinal, eu não morri ainda!”, diz, entre sorrisos. Pertencente à congregação das Irmãs Clarissas Franciscana Missionária do Santíssimo Sacramento, ela já desenvolveu suas atividades de ajuda aos mais pobres em Minas e na Paraíba, sempre em cidades do interior, “onde ninguém quer ir”, emenda. Está há 11 anos em Garanhuns e, mesmo diante de mil afazeres, garante que vai tentar acompanhar a programação teatral até o fim. Salve esse divino amor ao teatro!
MADLÉIA + ou - DOIDA: Henrique Celibi, o protagonista da peça, conquistou o título de melhor ator deste ano, no projeto Janeiro de Grandes Espetáculos, no Recife. Bem à vontade em cena, ele traveste-se de uma mulher abandonada, uma espécie de Medeia que canta músicas do cancioneiro popularíssimo do Brasil e sofre pelo amor a um belo rapaz. Mais velha, ela o perdeu para a jovem filha “aguada” de um poderoso ricaço. Inconstante, ela ama e odeia aquele que a deixou, a ponto de preparar uma vingança terrível para os seus três inimigos, incluindo ainda os dois filhos que teve, como forma de punir o pai, deixando claro que o coração pode, sim, mandar na nossa razão.
O mais interessante da encenação de Carlos Bartolomeu é a valorização ao próprio texto costurado por Celibi, egresso do irreverente Grupo de Teatro Vivencial, símbolo da década de 1970, em Olinda, com clara referência ao Tropicalismo e à subversão dos cânones do teatro. Assim, as belas palavras do texto do clássico “Medeia” são atreladas às frases de canções românticas imortalizadas por Peninha, Wanderléa ou Fafá de Belém. “Abandonada por Você” ganhou coro da plateia, que divertiu-se a valer com o à vontade do ator em cena, a ponto dele brincar com o “cordão umbilical” que o atrapalhava a todo o instante (o equipamento de microfone dispensável diante do vozeirão do intérprete).
Eduardo Filho, parceiro dele no palco, toca instrumentos e executa passos da capoeira no papel do jovem ex-amante, agora chamado de “gigolô” e “aproveitador” pela magoada mulher que conclama vingança aos orixás, e causou frisson nas suas entradas mais sensuais, com uma nudez prometida, mas praticamente não vista ao final da montagem. Apesar disto, a plateia – a maior da peça, até o momento – saiu feliz com tanto amor derramado, cheio de ais entre o cômico-trágico, o patético e o mundano.
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