PORTAL- Como você se sente em estreia mais uma vez?
CARLOS BARTOLOMEU- Sinto-me confortavelmente tranquilo. Não tendo mais ilusões sobre minha importância no seio teatral da cidade, conto com meu espírito, e amigos em passagem pra realizar minha dramaturgia. Quero com isso dizer que me sinto livre, desapegado da necessidade que se conjugam a vida de um artista. O fazer artístico para mim, torna-se a cada movimento criativo um caminho de aprendizagem sobre minhas verdades mais interiores. Apesar de minha aplicação à forma, essa deve ser compreendida como a expressão de uma conversação íntima, onde os gestos, palavras e desenhos de movimentos seriam a sugestão possível de algo que em sendo muito próximo, me reenvia para lá de mim.
PORTAL- Medeia é uma peça machista?
CARLOS BARTOLOMEU- Medeia de Eurípedes para mim seria uma declaração afirmativa, embora dolorosa sobre o diferente, o estranho, o obscuro. Uma ritualística acusação sobre a impossibilidade ocidental de reverencia tais máscaras; a cruel negativa de introduzir o diálogo com o a passividade agressiva experimentada pelos muitos ângulos do gênero. A Medeia de Henrique Celibi é a exposição dessa agressividade voltada contra a mente da personagem, a inconsciência de que tal condição é cultural e passível de mudança. Acrescente-se a isso, firulas paródicas, deboche e o aclamar da insanidade que minha encenação instigou.
O mito de Medeia, hoje, esperneia por obra e graça de sua carga infanticida, ao meu ver de menor aporte que o fato dela ter investido contra o poder estabelecido, o masculino, o dogmático, quando apeada de sua associação com o mesmo. Emociona-me pensar que sua destruição foi ditada por sua ignorância sobre o desejo de poder, e a ação física do próprio tempo. O mito arrancada a máscara do feminino oportunista, só deixa para ele, vingança e fuga. Especulo ser esta a razão de tal personalidade ter amparado carreiras em seus momentos duvidosos. Deixo escapar tal "impropriedade" ao lembrar da interpretação de Callas para o Medeia de Pasolini. A ausente presença de Onassis como fermento de sua interpretação pulsa naquela ardente criação.
PORTAL- Quem é Carlos Bartolomeu?
CARLOS BARTOLOMEU- Penso que sou um homem que compreendeu seus limites, que fez de suas repetidas invenções, a sua medida. Honro meu gosto, desgosto e mau gosto, e minha indestrutível capacidade de amor pela poesia das coisas menores, por vezes chatas e sem graça. Revertendo em todos os casos, a falta de ternura pelo simplesmente tolo e humano.
PORTAL- Qual a importância do Vivencial Diversiones (de onde surgiu o ator de MADLEIA (Henrique Celibi) nos dias de hoje ?
CARLOS BARTOLOMEU- Qual seria? Pergunto também eu? Penso que apesar da tentativa de sacralizar o grupo, a coisa que ele deixou pelo menos em mim, foi a alegria da sacanagem, fazer teatro sem compromissos com os enfadonhos do momento político, ou teatral. Amavam o espetáculo, xerocando dramaturgias, permitiram-se reinventar liberdades teatrais e morais.
PORTAL- Apresente Celibi aos neófitos. Quem é esse artista para você?
CARLOS BARTOLOMEU- Celibi é um vivente, não é um sobrevivente. Artista maior entre tantos menores, escritor de textos pra cena teatral, criador visual, báquico intérprete de si mesmo e de outras máscaras imprescindíveis. Foi viveca e não foi. Aprendeu com Beto Dinis a arquitetura de palco. Coreografou vestimentas para corpos do samba em evolução do carnaval carioca e deu luz ao maior sucesso de público de todos os tempos da cena pernambucana: Cinderela a estória que sua mãe não contou. Enfim, um/a MAD LEIA. Ou seria bad?
PORTAL- Você acredita em vanguarda permanente? O teatro do mundo está evoluindo ou só no Recife evolui assim?
CARLOS BARTOLOMEU- Se não for permanente flex não é vanguarda, é retaguarda. Todavia, o fato de pipocar pela manhã não nos permite contabilizar sua realidade como potencia. De fato, temos que esperar o entardecer para conferir sua legitimidade. Ou quem sabe, não seria a simples realidade de nascimento, a sua essência? Por pura sorte, ou proteção dos fados literários, ganha classificação de clássico... Acho que o teatro do mundo acompanha a realidade de seu tempo... O que isso queira considerar, dando muito assunto, mas, é tarde tenho sono e ainda tem três perguntas pra responder.
PORTAL- Sobre o Bartolomeu escritor: o que você está dizendo?
CARLOS BARTOLOMEU- Sou um preguiçoso... Preciso sempre de tempestade e ímpeto. Mas, venho me esforçando pra terminar um certo texto que denominei de TEATRO PRETENSIOSO. Nos Aprendizes em Cena do Centro Apolo-Hermilo, agora em novembro, vocês verão uma amostra, um dos quadros da peça denominado O JOGO DA AMARELINHA.
PORTAL- O que acha da política (Recife/ Pernambuco/ Brasil/ Outros países)?
CARLOS BARTOLOMEU- Em crise de valores, acometida ainda de velhos fantasmas em novas fantasias. No caso brasileiro especificamente, visita-se mais uma vez a infeliz necessidade do pai protetor, do herói maluquinho e da incapacidade crônica de se ler o passado. Salvo melhor juízo, é dando que se recebe é lema, lei e recurso.
ENTREVISTA a Moisés Neto
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